VELHA FIGUEIRA



(À figueira da Pr. VII de Setembro – Rio Claro)

Velha figueira de um jardim antigo,
A ti dirijo minha voz sem cor,
Como se fosses um sincero amigo
Que me escutasse com devido ardor.

Conheces o prazer e o dissabor
Dos muitos corações que foste abrigo
E a derradeira glória, ou mesmo dor,
Quero vivê-la, mas viver contigo...

Viste-me pequeno e, num momento,
Tornar-me um homem, trabalhar e amar
E me verás passar na voz do vento;

Mas tu hás de ficar, assim constante,
Vendo os homens que passam, sem cessar,
Na sua vida avara de um instante...

Soneto ao Capitão Odair

Por ocasião da homenagem ao "Capitão Odair", pelos 45 anos de serviços prestados à Aehda, respeitada entidade que beneficia jovens de Araras, SP,  por meio de programas, projetos e ações socioeducativas, foi declamado, por sua família, um soneto criado especialmente para a data, pelo seu amigo Ideney Gonçalves de Oliveira. Veja abaixo:

Soneto declamado em 26/11/2011.

AOS MEUS INIMIGOS



Quem me condena não condeno e assim
Que zombem do meu credo e pensamentos;
Terei perfumes ao chegar ao fim
E dormirei na glória os meus momentos.

Que falem sempre, pois terão alentos,
Que ladrem infamantes junto a mim;
Deixá-los-ei no rol dos desalentos
E colherei seus ais em meu jardim.

Um dia, se a vitória passageira
Acenar-me, sorrindo, a despedida
E fugir para o céu a alma ligeira,

Hei de fitar meu sol na terra ardida,
Porque colocarei real bandeira
Nos píncaros dourados desta vida!

EU NÃO CHORO



Eu não choro! Jamais verão meu pranto,
Porque sou como as dunas de um deserto;
O tufão do viver me fere tanto
Que me abre o coração, mas eu não choro...

Invejo as nuvens pelo céu aberto
Que tem a chuva , que é seu choro santo,
E não compreendo, não atino ao certo,
Porque não tenho as lágrimas que imploro;

E vejo outras pessoas... quando choram
Parece que sentem mais queridas
Desabafando o mal que as martiriza;

E as pérolas, que aos olhos lhes afloram,
Vão aliviando as dores escondidas,
Num pranto que redime e diviniza.

EU TE CONDENO



Eu te condeno por tão falso ardor,
Por todo o mal que tens, cruel maldita,
Por esta mágoa que me causa dor,
Pela fogueira que em meu ser crepita.

Eu te condeno pela triste dita
Que pos em meu viver teu dissabor,
Pois o sorriso que inda em mim palpita
É falso e frio como o teu amor.

Eu te condeno pelo tempo enorme
Que mendiguei carinho ao lado teu,
Se tens no corpo um coração que dorme.

Eu te condeno pelo que chorei,
Por esse furto do meu pobre eu,
Por outras moças que, por ti, deixei...

FELICIDADE



Felicidade é a novela
Mais linda que o mundo tem:
Uma casa sempre bela,
Um alguém que nos quer bem,

Uma família que vela
Da nossa vida o vaivém
E que a Deus, por nós, apela
A glória que mora além...

Vivendo dos devaneios,
Que nos prendem nos enleios
Da emoção que nos invade,

Felicidade é, somente,
A própria vida da gente,
A própria Felicidade!

FINADOS



Sinos tristonhos badalando além,
Ar desditoso no chorar do dia,
Homens e damas que se vão e vêm
Com olhos turvos de melancolia;

Vasos de flores sobre as sepulturas
Falam saudade que ficou de alguém...
Vivos que sofrem pelas amarguras,
Mortos que vagam, mas não são ninguém.

Em cada campa se aconchega um ser
Que já não crê no sonho e no viver
E vê, por tudo, mágoa e solidão.

São pais e filhos, são irmãos e netos,
Que já não vivem com os bons afetos,
Que já não vivem com o coração...

FLORES BELAS

FLORES BELAS

(À memória de Osmar e Maria Ap., meus irmãos)

Foram as flores de uma fronde bela
Que em pleno sol de deslumbrante aurora
Tombaram murchas sobre a terra, a cela
Que pouco liga a quem lamenta e chora.

E no lindo jardim desta novela
Ficou somente, inda divina agora,
Meiga fragrância que constante vela
A rama triste que a lembrança olora.

Foram sem manchas como as puras fontes
Que vão sem manchas procurando o mar
Rompendo campos, matagais e montes.

E como longo adeus, breve ilusão,
Ficou apenas o pranto em cada olhar
Como fontes de amor do coração.

HOJE


Carrego a dor de uma paixão perdida
Que me devora num cruel descrer
E assim, aos poucos, neste meu sofrer,
Pressinto na alma uma anormal ferida.

Perdi meus anos neste mar de lida,
Quando sonhava de jamais perder,
Seguindo pelos ermos do viver
Que me fez velho na manhã da vida.

E sinto mágoas pela aurora finda
Chorando só pela paixão tão linda
Dos áureos tempos de paixões reais...

Hoje me restam: - uma vida má,
Uma lembrança, que morrendo está,
E uma ferida que não sara mais...

HOMENAGEM


(Aos meus irmãos, poetas de Rio Claro)


Rio Claro canta e no seu verso existe
Um pouco de esplendor e de Brasil.
Fala de um povo que a sonhar persiste
E traça, amando, o seu feliz perfil.

E docemente, no fanal que assiste,
A lira acorda, sob um céu de anil,
Miguel Simões, Martins da Silva, o Triste,
Eduardo Leite, a popular Calil...

Mas quem dedilha a nossa lira agora,
Repleta de beleza e de bondade,
Suspira tristemente e quase chora

Porque nela perdura com destaque,
Falando de grandeza e de saudade,
A sombra colossal do Arthur Bilac...

JOVEM PROFESSORA



Como um raio de sol rompendo a treva,
Fazendo despontar solene o dia,
Também a professora com mestria
A mente da criança aclara e eleva.

Inda tão jovem, quase como os entes
Que com carinhos ela ensina e anima,
Parece ter o coração acima
Da luz do mundo e da ambição dos crentes.

E fala do viver tão decidida
Que parece que há muito está a viver
Quem, na verdade, nem conhece a vida...

Dá gosto ouvi-la... linda... comovente...
E eu tudo esqueceria com prazer,
Para aprender com ela novamente...

LOUCURA



Que me importa a vida agora
Se sem brilho a lua brilha?
Se o sol sem luz me devora
E à pobre mãe sem a filha?

Se a água gelada me queima
E o quente fogo me gela?
E o tolo mundo que teima
Tirar-me, do barco, a vela?

Pois, então, por que tirar
As ondas do grande mar
E meu corpo deste engenho?

Por que tirar desta lida
O meu restinho de vida,
Da vida que já não tenho?

LUAR NA AMAZÔNIA



Lá na distância perdida,
Quando é noite de luar,
Toda a Amazônia temida
Desperta para sonhar.

Correm sacis deformados,
Ecoam risos tremendos,
Saltam índios bronzeados
E surgem monstros horrendos...

A lua, por trás da mata
Traça seu disco de prata,
Empresta ao ar seu fulgor;

E embaixo, à beira do rio,
A linda Iara, sem frio,
Canta seus versos de amor...

MINHA RUA



É a rua da singeleza a rua na qual resido.
Sem povo durante o dia, olhando a noite sozinha,
Fala mais pura do céu, em luzeiros esculpido,
Fala da sua história, aquela que outrora tinha.

É a rua do sonhador, que vive só de saudade,
Onde se fala de Deus, onde se cresce de fato,
Por ela se encontra a paz, como se encontra a verdade,
Em cada pedra pisada, em cada amigo cordato.

É o roteiro do meu ser, pois nele fundo a gravei,
E porque nela sorri, às vezes me amargurei,
Que a rua espera comigo na crença ou solidão.

Para mim é a rua eterna, a rua da melodia,
A rua dos velhos passos, da infantil alegria,
A rua para se amar, a rua do coração...

MINHA SALA DE AULAS


(Aos colegas do Científico do Joaquim Ribeiro, Curso Noturno – Rio Claro, 1959)


Minha sala de aulas no Instituto...
Paredes alvas sustentando o teto,
O quadro negro, qual sombrio luto,
E a porta aberta, num sinal de afeto.

Brancas cortinas sobre três janelas,
Velhas carteiras e u’a mesa ao lado,
Um grande quadro, de pinturas belas,
Com Monteiro Lobato retratado.

Um armário fechado, uma cadeira,
Professores ditando ensinamentos
E ali, feliz, a mocidade obreira...

Tudo tão belo e de visão ligeira
Que fui gravando, em olhos sonolentos,
Como um retrato para a vida inteira...

MOCIDADE E MORTE



(À memória do amigo Alberto Picarelli)


Por que será que a mocidade morre,
Quando é a luz da natureza viva,
Quando palpita na ilusão e aviva
A chuva de emoções que dela escorre?

Quando se troca uma paixão esquiva
Por lindo sonho que ao descrer socorre
E quando ao beijo do prazer se corre
Para afogar a solidão nociva?

É triste ver partir na flor da idade
Alguém que deixa as mágoas da saudade
Que não se pode amá-las, nem descrê-las.

Só nos consola saber que a mocidade,
Mesmo morta, não morre de verdade,
Como não morre o sol nem as estrelas!

NOIVOS


Estamos noivos, meu amor, estamos
Plantando as bases de um jardim divino
Que um dia serão frutos, serão ramos
Do lar sem manchas que te juro dar.

Agora tudo é sério, já passamos
Pelo namoro breve e repentino;
Agora, lentamente, nós levamos
O barco nosso para um vasto mar.

Ser noivo, meu primor, talvez já disse,
É colher um laurel na mocidade,
Ainda recordando a meninice;

E vamos caminhando nessa idade
A sorrir, sem temer a atroz velhice,
Que ainda é uma semente de saudade...

NUM ÁLBUM



Teu álbum é teu coração que assiste
O amor supremo de outros corações,
Pois muitos deles, neste mundo triste,
Guardaram ais, deixaram-te canções.

O coração é assim, o bem transmite
E não desperta nunca as más ações,
O homem sim, é que cruel insiste
Em sufocar as próprias ilusões.

Portanto, amiga, os breves versos feitos
P’ra te agradarem e que despontaram
Como expressões do bem entre os defeitos;

São deste coração que está comigo
Que te oferta as coroas que enfeitaram
A cruz de amor plantada em seu jazigo...

O AGONIZANTE

O AGONIZANTE


Ele definha sem chorar de dor,
Mas solta da alma solitários ais;
Não quer deixar aqui seu grande amor,
Nem quer ficar p’ra não sofrer demais.

Quanta maldade, confusão, injúria,
Amarguraram o que nele havia,
Mas encontrou, por entre tanta fúria,
Um anjo bom que o amava e compreendia.

Atroz tormente o coração encerra
Lutando contra a morte, a vida, o mundo,
Numa tremenda e desgraçada guerra;

E assim padece num descrer profundo;
Não quer ficar p’ra não vagar na Terra,
Nem quer partir p’ra não deixar seu mundo...

O CASAMENTO



O casamento é qual dourado pomo
Que a nossa vida aromatiza e anima;
Solta a semente do seu áureo gomo
Que vai florindo pelo céu acima.

São dois amantes que, de tão queridos,
Uniram juntos os anseios seus
E que benditos, e por fim unidos,
Juntam as mãos e vão servir a Deus.

Dores não vêem pela longa estrada,
Sonham que a vida ser-lhes-á um vinho,
Sonham que tudo ser-lhes-á um nada;

Assim enfrentam o comum caminho,
Vivendo sempre em plácida alvorada,
Como dois pombos no calor do ninho...

O MAR E VICENTE DE CARVALHO



Agora, a te quebrares sobre pedras,
Tu choras, mar imenso, a tua dor;
Nas tuas águas solitárias medras
Terna saudade pelo teu cantor.

Outrora em versos, em poemas lindos,
Vicente de Carvalho te exaltou,
Mas tudo passa e com os dias findos
Também teu grande bardo se findou.

Tu soluçaste, ó mar, jamais alguém
Terás, capaz de te cantar tão bem
E gemes no vaivém de cada onda...

Mas sei que às noites, se inda faz luar,
Sonhando às praias do seu velho mar,
O vulto triste do poeta, ronda...

O NOSSO SONETO


Quando no tempo, querida,
A musa não me inspirar
E quando fugir a vida
Do meu festivo cantar,

Este soneto que olvida
O sofrimento e o chorar,
Será nossa nau perdida
Nas vagas do nosso mar.

Nós dois, então, bem velhinhos,
Reveremos os caminhos
Que cruzamos com paixão.

Este soneto inspirado
Será qual credo sagrado
Da igreja do coração.

O POETA



No verso de um soneto outro soneto,
Como na fuga de um amor tem outro,
E vai vivendo assim o verdadeiro
Crente... o poeta que sublima o mundo.

A natureza existe, mas os leigos
Dela não tomam parte de verdade,
Mas os vates a vivem, nela ficam
Como parte da mesma e seus encantos.

Todas as artes se resumem nele:
É pintor ao pintar com luz, com alma,
O que de nobre crê, de belo avista;

É escultor, professor, é literato
E músico também, ao dedilhar
As cordas desiguais do coração...

O TUBERCULOSO



Num quarto escuro de uma casa pobre
Sofre um rapaz em incessante dor;
Verte seu sangue sobre um cobertor,
Único abrigo que seu corpo cobre.

Não tem filhinhos, nunca teve amor,
E assim é grato, pois enfim descobre
Que está melhor, no seu martírio nobre,
Sem ser chorado, sem nenhum clamor.

Sem ser chorado? Sem querer menti;
Aos pés da cama uma velhinha chora
E reza e sofre e o beija enternecida.

É mãe, não teme, até deseja a si
O negro mal que, tão cruel, devora
O filho caro que se vai da vida...

O ÚNICO AMOR



Ás vezes, recordando os meus albores,
Padeço nesta ausência de carinhos,
Pois ontem caminhei sem dissabores
E agora estou jogado sobre espinhos.

Aquelas juras todas, sem temores,
Vi-as fugindo assaz os meus caminhos;
E os vis sorrisos só me deram dores
E encheram de descrer os falsos ninhos.

Falsos amores... passageiras glórias
Que o tempo sufocou com o seu manto
Na sucessão dos erros e vitórias...

Ficou, contudo, o amor que nada exige,
O amor de mãe... o mais perfeito e santo...
Que não finda, não foge e não transige!

ONTEM E HOJE


Há pouco tempo, quando me esperavas,
Fazias tudo para me agradar;
Era como se um santo procuravas,
Porque me colocavas num altar.

As promessas de amor que me juravas
Meu coração chegavam a afogar
E eu sentia, querida, que me amavas,
Como no mundo não se espera amar.

Girou o mundo... pelo tempo andamos
E pelo tempo nosso amor morreu
Nos passos orgulhosos que traçamos;

Se tu me beijas, gélida e indecisa,
Noto no beijo, que não é mais meu,
Um resto de esperança que agoniza.

OS BONS AMIGOS



São tão escassos, mas leais e certos,
Que são a sombra que nos segue os passos;
Têm os grandiosos corações abertos
E nos estreitam, rindo, nos seus braços.

Quando conosco, em dias mais incertos,
Nunca nos negam um milhão de abraços
E são oásis benditos nos desertos
E da esperança os mais risonhos traços.

Os bons amigos, como nos cativam!
Em nosso coração, sorrindo, avivam
Belas passagens que o viver embota...

E gostamos de ter, até na morte,
A dádiva da fé, do bem, da sorte,
Que a natureza com ternura os dota.

OS GRANDES



(Ao amigo Dr. José Eduardo Leite)


O Grande nasce Grande, de alma forte,
E coloca num plano, bem unidos,
O coração e a fé, razão e sorte,
E são ousados e também queridos.

São Grandes frente à vida e frente à morte
E pelos falsos grandes são temidos;
O mundo faz dos mesmos o seu norte
E a glória dá-lhes tronos definidos...

Ó pequenino, ó triste, ó deprimido,
Procura nesses gênios um abrigo
P’ra te sentires calmo e protegido,

Porque bem sabes que no Grande amigo
Ao menos acharás, crente e sentido,
Um grande olhar para chorar contigo...