Na antiga Santa Gertrudes,
a velha cidade minha,
um par de jovens se amou.
A moça chegou primeiro:
nas terras férteis e quentes
de uma fazenda formosa
brotaram muitas sementes
que suas mãos semearam.
Filha de Limeira, a terra doce,
onde os laranjais, como pomos de ouro,
reluzem nos pomares,
tinha nos olhos infantis
a ternura sem par das juritis,
as pequenas rolinhas do sertão.
A pele amorenada, a pele herdada
das cálidas campinas da Espanha,
o berço de seus pais.
Na família numerosa
era assim como uma rosa,
como uma flor, nada mais;
tinha a doçura dos frutos
brotados na sua terra.
E o chão todo foi mexido;
as colheitas foram muitas...
era a Espanha ajudando
o meu Brasil florescer
e o solo que a viu criança
viu despontar a mulher.
Um dia ele chegou...
Um rapagão bem moldado,
por cujas veias corria
o sangue da mocidade.
Trazia no porte atlético
uma soberba aparência.
Seu coração bom e amigo
sorria para o porvir
com o sorriso dos moços,
que faz a mágoa findar
e o pessimismo fugir.
Nos braços fortes trazia
o vigor da antiga Araras,
a terra que o viu surgir.
Rolavam no peito ardente
as cantigas indolentes
das plagas de Portugal
onde nasceram, um dia,
seus extintos ascendentes.
Era pequena a cidade
e a fazenda o conquistou.
Lá ele a viu. Conheceu
a flor morena de Espanha
e dela se enamorou.
Santa Gertrudes sonhava
no sonho daqueles jovens
e lhes dava flores lindas
perfumando seu amor.
Tudo era belo e solene,
de uma ternura perene,
de um encanto natural.
Eles se amaram nos campos,
no adorno das primaveras,
no canto da passarada,
na água dos ribeirões,
nas fibras dos corações...
Até que um dia na igreja
ambos felizes surgiram
e seus destinos uniram.
Numa casinha modesta,
branca e pura como a paz,
eles fizeram seu lar
e ali viveram de afetos.
Hoje são calmos e idosos.
Foi-se o vigor, foi-se o sonho,
as tardes brandas e as rudes,
como um dia eles se foram
da eterna Santa Gertrudes...
Porém deram à cidade
um presente pequenino
na pessoa de um menino
que agora verseja e canta.
E a minha terra esquecida
ouve agora, enternecida,
estes românticos ais:
graças a ele e a ela,
meus nobres e amados pais!