(Poema vencedor do Concurso instituído
pelo IAPAS (São Paulo) para comemorar
a Semana da Pátria do ano de 1980)
Neste solo alvissareiro
tu nasceste, brasileiro,
querendo a paz com constância;
e nesta terra tão tua
teu sangue te anima e estua
em constante ressonância.
E assim progrides e sonhas
entre crianças risonhas
e entre jovens promissores,
levando nas alegrias
a paz de todos os dias
e o aroma de tantas flores...
Mas se um dia, brasileiro,
este teu solo altaneiro
for insultado ou traído,
pega teu sabre e a metralha
e parte para a batalha
vingando o chão tão querido!
Não largues, quando o inimigo
cercar-te de ódio e perigo,
o teu petardo feroz,
pois se a guerra é negra e hostil
o jugo é mais negro e vil
e a dor é mais longa e atroz.
Se acaso, patrício forte,
vires torturas e morte,
não largues do teu fuzil
e no peito que te inflama
ouvirás a voz que chama:
- “Às armas, filho viril!”
E mais que o fogo tu ardas!
que grites mais que as bombardas,
que grites mais que os canhões:
- “Eu sou, eu sou brasileiro,
“eu sou filho do luzeiro
“que tem primor e canções!
“Lutei na terra indaiá
“unido a Tibiriçá,
“o guarda do florestal!
“Sou patrício de Caxias,
“Albuquerque e Henrique Dias,
“Pedro I e Cabral!
“Pisei montanhas a prados,
“pus índios catequisados
“ao lado dos jesuítas;
“fundei meu São Paulo eterno,
“que do meu Brasil moderno
“se fez cartão de visitas.
“Em cada montanha ou cerro
“tracei caminhos de ferro,
“busquei selvagens hostis;
“caminhei com bandeirantes,
“varei matas verdejantes,
“sempre contente e feliz.
“Fundei povoados abertos
“e subi com passos certos
“à forca com Tiradentes;
“mais tarde corri, montado,
“repetindo ao povo o brado
“que o fez livre e independente!
“Vi minhas patrícias caras,
“Quitéria e outras jóias raras
“como Joana, a Abadessa,
“a linda Ifigênia, virgem
“que por graça e por origem
“foi do meu solo a princesa!
“Lutei nas hostes caudilhas
“ao lado dos Farroupilhas,
“os gigantes do Brasil;
“disposto contra o perigo
“sem ter, sequer, um amigo,
“lutei sozinho e febril...
“Mas quando certa bandeira,
“inimiga e traiçoeira,
“tentou matar minha terra,
“uni-me com todo Império
“e como raro minério
“brilhei no centro da guerra.
“Bati-me como leão
“vinguei o insulto vão
“que ao solo pátrio lançaram;
“salvei a terra que adoro
“onde vivo, sonho e choro
“e tantas glórias passaram...
“Sofri nas duras batalhas,
“derrotei hostes canalhas,
“chorei com mães, com esposas...
“Debrucei-me, comovido,
“em cada túmulo erguido
“coberto com frias lousas.
“Voltei a lutar no Prata,
“que a tirania insensata
“quis me fazer seu cativo;
“venci a tremenda disputa
“na patriótica luta
“que no meu sangue revivo.
“Fui marujo vitorioso
“sob as ordens de Barroso
“no instante da decisão;
“venci Laguna e Avaí,
“penetrei, quando venci,
“na deslumbrante Assunção.
“Salvei com Antonio João
“a glória do meu torrão
“numa imortal fortaleza;
“plantei, sorrindo, o café,
“grande exército da fé
“que mostra nossa grandeza.
“Com esperanças e empenhos
“construi muitos engenhos,
“fiz o açúcar de prata;
“com Casimiro de Abreu
“chorei o passado meu,
“a minha infância cordata.
“Assinei com pulso forte,
“vencendo a opressão e a morte,
“com Isabel a Lei Ouro...
“e do povo dos amores
“recebi risos e flores
“que guardei no meu tesouro!
“Mais tarde, como bom filho
“chorei no tristonho exílio
“com nosso Pedro II;
“roubaram sua rainha,
“pois roubando a pátria minha
“roubaram seu doce mundo.
“Desacatei com Peixoto
“o louco estrangeiro ignoto
“que quis pisar meu país;
“travei lances desumanos
“lá nos campos italianos
“contra o nazismo infeliz!
“Às ordens de Osvaldo Cruz
“eu fiz a meu solo jus
“limpando a cidade bela,
“que a pobre sofreu na entranha
“toda a tirânica sanha
“da triste febre amarela.
“Ergui-me em sonhos do chão
“com nosso Padre Gusmão
“na Passarola pioneira;
“depois, num frágil avião,
“fui buscar num solo irmão
“um louro a nossa bandeira.
“Lutei nas alas paulistas
“sob as treze augustas listas,
“com democráticas mãos;
“defendi, na luta insana,
“o forte Copacabana
“com os meus dezoito irmãos...
“Fundei capelas e escolas,
“dei paz, carinhos e esmolas,
“fui bravo paraibano
“sofrendo com o doutor
“que marcou com glória e dor
“o heróico nome: - Laureano!
“Vi, numa noite de lua,
“Iracema, a virgem nua,
“correndo na mata em flor;
“amei a mãe d’água, Iara,
“de beleza grande e rara,
“cantando versos de amor.
“Vi Caipora e Boitatá,
“o Boto vi e o Anhangá,
“vi o Saci-pererê;
“sofri no agro destino
“do valente nordestino,
“olhando meu solo arder.
“Passei minha infância linda,
“fiquei moço e forte, ainda
“nos campos primaveris;
“entreguei ternuras minhas
“às lindas brasileirinhas,
“mimosas deusas gentis.
“Eu sou filho lá dos pampas,
“das montanhas e das rampas,
“da bela Rio de Janeiro;
“descendo de flores mil,
“das orquídeas do Brasil,
“do cearense jangadeiro.
“Nasci nas glórias do sul,
“nas lendas do norte azul,
“nas alegrias do leste;
“admirei meu Cruzeiro
“desde o limite primeiro
“até as florestas do oeste.
“Fiz prece à Senhora minha
“Aparecida, a Rainha,
“saudei Jesus no Natal;
“nas festas do meu São João
“soltei meu belo balão...
“e brinquei no carnaval.
“Vi roseiras e craveiros
“adornando meus canteiros
“num jardim primaveril;
“abracei jacarandás,
“carvalhos, jequitibás,
“nas florestas do Brasil.
“Tive u’a mãe brasileira
“tão forte como a palmeira,
“virente mãe dos praieiros;
“sou filho de um bom caboclo,
“tive irmãos, amores loucos,
“todos eles brasileiros.
“É por isso que esta terra
“as amarguras desterra
“do meu grande coração;
“fiz dela meu puro amor,
“meu poema e minha flor
“e o canto de redenção
“Eu quero tudo da vida
“da minha terra querida,
“do meu solo sem rivais;
“as águas do rio gigante
“e a serenata incessante
“das aves dos matagais.
“Divido os dias que tenho
“com cada rio, cada engenho,
“com a Princesa do Mar;
“sou filho do nauta ousado,
“do guerreiro bronzeado,
“do preto que vi chorar...
“Escravo sou, brasileira,
“da tua cútis trigueira,
“da meiguice em teu olhar;
“da tua eterna beleza,
“onde canta a natureza
“com o que tem p’ra cantar...
“Eu luto por tudo, tudo...
“por todo o arvoredo mudo
“e pelos mares inquietos;
“pela língua do valor,
“os beijos do meu amor
“e – de meus pais – os afetos.
“Pelas violas doridas
“que soltam notas perdidas
“nos ranchinhos de sapê;
“pela formosa morena
“que afaga, na mão pequena,
“os rubros grãos de café.
“Pelo vaqueiro dolente
“que vai sob o sol ardente
“conduzindo o gado seu;
“pela Amazônia sem parar
“onde o valente jaguar,
“forte e temível, nasceu...
“Onde belas brasileiras,
“as amazonas guerreiras,
“vibraram seus rijos arcos;
“onde os ribeiros pululam
“enquanto os macacos pulam
“pelos ramos dos paus-d’arco.
“Onde o vate uirapuru
“espalha seu canto nu
“e as aves se põem a ouvi-lo;
“onde mil igarapés
“e bravos canamarés
“guardam da mata o sigilo.
“Eu luto pelas rendeiras,
“as nordestinas faceiras
“dos vastos sertões brejeiros,
“onde, quais fortes tufões,
“correram nos corações
“os nomes dos cangaceiros.
“Bato-me pelos mineiros,
“valorosos garimpeiros
“que a pátria agradecerá;
“pelos esguios coqueiros
“e pelos verdes pinheiros
“do Estado do Paraná.
“Pelo gaúcho queimado
“que corre à busca do gado
“quase em pé na montaria;
“pelas cores do pendão
“que ao sopro da viração
“luz e progresso irradia.
“Pelo barulho tremendo
“das cataratas descendo
“em saltos fenomenais;
“pelas águas que, passando,
“deixam meu solo chorando
“por não voltarem jamais...
“E se, vencendo, eu voltar,
“hei de feliz encontrar
“o meu valente Brasil;
“e garboso, sem igual,
“o seu Hino Nacional
“se ouvirá no céu de anil...
“E uma voz escutarei:
“- Sofreste, filho, bem sei,
“mas és livre e sou também!
“E o Cristo do Corcovado
“falará: - Solo adorado,
“que sejas meu trono! – Amém!”