Até meus cabelos
estão me abandonando,
eu que tive a pretensão,
parodiando um ministro,
de me tornar “imexível”
e ser meu próprio patrão.
Abandonaram-me a infância,
a adolescência e a mocidade,
na sucessão desvairada
desta breve caminhada;
e, diante dos olhos baços,
a singeleza dos filhos
passou, deixando os rebrilhos
nos reduzidos espaços
que gravaram nos meus braços...
Minhas escolas, meus mapas
de tesouros sepultados,
meus anseios tão fugazes,
meus pais, irmãos, minha irmã,
culturas desabrochadas
em campos de outra manhã...
Também morreu-me a esposa
com quem aprendi a amar
e que gravou, na passagem,
a força de sua imagem
que jamais vai se apagar.
De todas essas lembranças
ficou-me a poesia
como pedra demarcando
cada passo sobre o chão...
Talvez sobreviva ou não,
quando também me deixar
o pulsar do coração!