DIVAGAÇÕES
Eu queria recolher gravetos,
mesmo ressequidos pelos anos
e, com eles, tentar brotar
as belas árvores tombadas
ao longo dos enganos,
pois me parece que o mais seco
dos gravetos tantos
ainda pode ter uma raiz com vida
e que aquecida
ao embalo de um amor profundo
pode mostrar o viço do passado,
as flores, os frutos, os encantos,
a promessa não cumprida
e o sonho profanado...
Eu gostaria de buscar na alma,
no mais recôndito cantinho da minh'alma,
a desprezada esperança
para com ela fazer voltar
em teu rosto querido
o riso de criança,
que num ponto qualquer
de teu semblante grave de mulher
dorme e mais dorme,
na incerteza de ressuscitar.
Eu gostaria muito de te ver
e de me ver sorrindo
para fazermos planos já desfeitos
e recompormos, plenos de ternura,
os dias esquisitos que vão indo
repletos de asperezas e amarguras
fazendo-nos sangrar e nos ferindo
e nos pisando até nos verem mortos.
Eu gostaria muito que quisesses
fazer de tudo uma nova espera
e me ensinasses, talvez, a ser bem quisto
e me deixasses, também, te ensinar
que se juntos fizemos tudo isto
poderemos reviver a primavera
e poderemos rezar, juntos e amantes,
a mais contrita e a mais sublime prece...