MEU RELÓGIO SILENCIOSO


Não marque os dias que busco,
meu relógio silencioso!

Os dias são como o vento
passando nos meus cabelos,
apenas que o vento os mexe
com carinhos e com zelos
e vai passando e brincando
em busca de outros cabelos...

Mas os dias deixam marcas,
brancas marcas desenhadas
sobre as imagens cansadas,
que vão marcando o semblante.

Meu relógio, não me lembre
os dias que estão por virem!
Não sei se devo ficar,
a tantos vendo partirem...

Deixe-me aqui procurar
a luz cantando no mar!   




QUESTÕES DE NATAL



Perguntei ao comerciante:
- que representa o Natal?
Respondeu-me, confiante,
ser a época marcante
para aumentar suas vendas,
arrecadando dinheiro
que procura prazenteiro
no desejo de crescer.
- Natal – diz ele – é vender,
comprar, marcar, revender...

Perguntei a uma criança:
- o que vê no seu Natal?
Graciosa e sem tardança
respondeu-me ser o tempo
de esperar Papai-Noel
para ganhar mil brinquedos
alegrando seus folguedos
e assim, com seus irmãos,
construir com suas mãos
ilusórios mundos sãos...

Perguntei a um pedinte:
- que lhe seria o Natal?
- É sempre o dia seguinte,
respondeu-me prontamente,
pois não sei se vou comer
ou vou de fome morrer
nesta constante amargura,
que me levará sem cura
a uma incerta sepultura.

Perguntei a um poeta:
- que pensa em cada Natal?
- É a Memória completa
de tudo que foi vivido;
de tudo que na passagem
deixou a fugaz aragem...
Entre esperanças e amores
é a paz dentre os dissabores,
o ressuscitar sem dores...

Perguntei ao religioso:
- que lhe parece o Natal?
mais contrito e respeitoso
respondeu que, em sua fé,
se encaminha para a igreja,
reza a prece benfazeja,
canta um hino comovido
e volta ao lar aquecido
mais cristão e agradecido.

Procurando sem cessar
em cada ser encontrei
uma forma de explicar
o Natal que o faz cismar.
Com alegria ou tristeza
cada qual busca a certeza
do advento do Messias,
que paira sobre os bons dias
e sobre as vidas vazias...

Então no meu coração
vejo a estrela de Davi
cruzando-me a solidão
e anunciando a redenção
da humanidade sem rumo...
Eu compreendo, por fim,
que Jesus renasce em mim
em cada gesto leal...

No bem que supera o mal
a todo instante é Natal.



OS SINOS DA CIDADE


Sinos que soam tão tristes
quando a tarde vai chegando,
que querem dizer ao mundo?

- Aqui, ali, tudo mente,
tudo engana sem pudor,
só na capela perdura
a paz, a luz, o calor...

Sinos que soam felizes
quando uma noiva se casa,
que dizem para o futuro?

- Que a vida sempre é promessa,
apesar de tantas mágoas,
que o amor puro é que vale,
como a mais benta das águas...

Sinos que soam funéreos
quando um humano se vai,
que querem dizer chorando?

- Que a flor que cai de seu ramo,
onde um instante ficou,
teve um valor, uma glória,
pois a semente deixou...

Sinos que soam tão ternos
quando chega um batizado,
que dizem, ó sinos meus?

- Que a esperança persiste,
que o sonho suplanta o adeus,
que as obras boas se salvam,
que Deus existe e que é Deus!



NATAL



Natal! Os sinos tangendo,
Festivo dia de luz,
Aves canoras erguendo
Um hino santo a Jesus;

Céu azul aparecendo
Onde sol de ouro reluz,
Berço pobre precedendo
Uma tosca e grande cruz...

Natal! Natal! Doces cantos,
Muitas crenças, raros prantos,
Algum pesar, mágoa ou dor...

No mais, a paz, a alegria,
Sonhos, risos, harmonia,
Pois Natal traduz amor!



VELHA FIGUEIRA



(À figueira da Pr. VII de Setembro – Rio Claro)

Velha figueira de um jardim antigo,
A ti dirijo minha voz sem cor,
Como se fosses um sincero amigo
Que me escutasse com devido ardor.

Conheces o prazer e o dissabor
Dos muitos corações que foste abrigo
E a derradeira glória, ou mesmo dor,
Quero vivê-la, mas viver contigo...

Viste-me pequeno e, num momento,
Tornar-me um homem, trabalhar e amar
E me verás passar na voz do vento;

Mas tu hás de ficar, assim constante,
Vendo os homens que passam, sem cessar,
Na sua vida avara de um instante...

Soneto ao Capitão Odair

Por ocasião da homenagem ao "Capitão Odair", pelos 45 anos de serviços prestados à Aehda, respeitada entidade que beneficia jovens de Araras, SP,  por meio de programas, projetos e ações socioeducativas, foi declamado, por sua família, um soneto criado especialmente para a data, pelo seu amigo Ideney Gonçalves de Oliveira. Veja abaixo:

Soneto declamado em 26/11/2011.

AOS MEUS INIMIGOS



Quem me condena não condeno e assim
Que zombem do meu credo e pensamentos;
Terei perfumes ao chegar ao fim
E dormirei na glória os meus momentos.

Que falem sempre, pois terão alentos,
Que ladrem infamantes junto a mim;
Deixá-los-ei no rol dos desalentos
E colherei seus ais em meu jardim.

Um dia, se a vitória passageira
Acenar-me, sorrindo, a despedida
E fugir para o céu a alma ligeira,

Hei de fitar meu sol na terra ardida,
Porque colocarei real bandeira
Nos píncaros dourados desta vida!

EU NÃO CHORO



Eu não choro! Jamais verão meu pranto,
Porque sou como as dunas de um deserto;
O tufão do viver me fere tanto
Que me abre o coração, mas eu não choro...

Invejo as nuvens pelo céu aberto
Que tem a chuva , que é seu choro santo,
E não compreendo, não atino ao certo,
Porque não tenho as lágrimas que imploro;

E vejo outras pessoas... quando choram
Parece que sentem mais queridas
Desabafando o mal que as martiriza;

E as pérolas, que aos olhos lhes afloram,
Vão aliviando as dores escondidas,
Num pranto que redime e diviniza.

EU TE CONDENO



Eu te condeno por tão falso ardor,
Por todo o mal que tens, cruel maldita,
Por esta mágoa que me causa dor,
Pela fogueira que em meu ser crepita.

Eu te condeno pela triste dita
Que pos em meu viver teu dissabor,
Pois o sorriso que inda em mim palpita
É falso e frio como o teu amor.

Eu te condeno pelo tempo enorme
Que mendiguei carinho ao lado teu,
Se tens no corpo um coração que dorme.

Eu te condeno pelo que chorei,
Por esse furto do meu pobre eu,
Por outras moças que, por ti, deixei...

FELICIDADE



Felicidade é a novela
Mais linda que o mundo tem:
Uma casa sempre bela,
Um alguém que nos quer bem,

Uma família que vela
Da nossa vida o vaivém
E que a Deus, por nós, apela
A glória que mora além...

Vivendo dos devaneios,
Que nos prendem nos enleios
Da emoção que nos invade,

Felicidade é, somente,
A própria vida da gente,
A própria Felicidade!

FINADOS



Sinos tristonhos badalando além,
Ar desditoso no chorar do dia,
Homens e damas que se vão e vêm
Com olhos turvos de melancolia;

Vasos de flores sobre as sepulturas
Falam saudade que ficou de alguém...
Vivos que sofrem pelas amarguras,
Mortos que vagam, mas não são ninguém.

Em cada campa se aconchega um ser
Que já não crê no sonho e no viver
E vê, por tudo, mágoa e solidão.

São pais e filhos, são irmãos e netos,
Que já não vivem com os bons afetos,
Que já não vivem com o coração...

FLORES BELAS

FLORES BELAS

(À memória de Osmar e Maria Ap., meus irmãos)

Foram as flores de uma fronde bela
Que em pleno sol de deslumbrante aurora
Tombaram murchas sobre a terra, a cela
Que pouco liga a quem lamenta e chora.

E no lindo jardim desta novela
Ficou somente, inda divina agora,
Meiga fragrância que constante vela
A rama triste que a lembrança olora.

Foram sem manchas como as puras fontes
Que vão sem manchas procurando o mar
Rompendo campos, matagais e montes.

E como longo adeus, breve ilusão,
Ficou apenas o pranto em cada olhar
Como fontes de amor do coração.

HOJE


Carrego a dor de uma paixão perdida
Que me devora num cruel descrer
E assim, aos poucos, neste meu sofrer,
Pressinto na alma uma anormal ferida.

Perdi meus anos neste mar de lida,
Quando sonhava de jamais perder,
Seguindo pelos ermos do viver
Que me fez velho na manhã da vida.

E sinto mágoas pela aurora finda
Chorando só pela paixão tão linda
Dos áureos tempos de paixões reais...

Hoje me restam: - uma vida má,
Uma lembrança, que morrendo está,
E uma ferida que não sara mais...

HOMENAGEM


(Aos meus irmãos, poetas de Rio Claro)


Rio Claro canta e no seu verso existe
Um pouco de esplendor e de Brasil.
Fala de um povo que a sonhar persiste
E traça, amando, o seu feliz perfil.

E docemente, no fanal que assiste,
A lira acorda, sob um céu de anil,
Miguel Simões, Martins da Silva, o Triste,
Eduardo Leite, a popular Calil...

Mas quem dedilha a nossa lira agora,
Repleta de beleza e de bondade,
Suspira tristemente e quase chora

Porque nela perdura com destaque,
Falando de grandeza e de saudade,
A sombra colossal do Arthur Bilac...

JOVEM PROFESSORA



Como um raio de sol rompendo a treva,
Fazendo despontar solene o dia,
Também a professora com mestria
A mente da criança aclara e eleva.

Inda tão jovem, quase como os entes
Que com carinhos ela ensina e anima,
Parece ter o coração acima
Da luz do mundo e da ambição dos crentes.

E fala do viver tão decidida
Que parece que há muito está a viver
Quem, na verdade, nem conhece a vida...

Dá gosto ouvi-la... linda... comovente...
E eu tudo esqueceria com prazer,
Para aprender com ela novamente...

LOUCURA



Que me importa a vida agora
Se sem brilho a lua brilha?
Se o sol sem luz me devora
E à pobre mãe sem a filha?

Se a água gelada me queima
E o quente fogo me gela?
E o tolo mundo que teima
Tirar-me, do barco, a vela?

Pois, então, por que tirar
As ondas do grande mar
E meu corpo deste engenho?

Por que tirar desta lida
O meu restinho de vida,
Da vida que já não tenho?

LUAR NA AMAZÔNIA



Lá na distância perdida,
Quando é noite de luar,
Toda a Amazônia temida
Desperta para sonhar.

Correm sacis deformados,
Ecoam risos tremendos,
Saltam índios bronzeados
E surgem monstros horrendos...

A lua, por trás da mata
Traça seu disco de prata,
Empresta ao ar seu fulgor;

E embaixo, à beira do rio,
A linda Iara, sem frio,
Canta seus versos de amor...

MINHA RUA



É a rua da singeleza a rua na qual resido.
Sem povo durante o dia, olhando a noite sozinha,
Fala mais pura do céu, em luzeiros esculpido,
Fala da sua história, aquela que outrora tinha.

É a rua do sonhador, que vive só de saudade,
Onde se fala de Deus, onde se cresce de fato,
Por ela se encontra a paz, como se encontra a verdade,
Em cada pedra pisada, em cada amigo cordato.

É o roteiro do meu ser, pois nele fundo a gravei,
E porque nela sorri, às vezes me amargurei,
Que a rua espera comigo na crença ou solidão.

Para mim é a rua eterna, a rua da melodia,
A rua dos velhos passos, da infantil alegria,
A rua para se amar, a rua do coração...

MINHA SALA DE AULAS


(Aos colegas do Científico do Joaquim Ribeiro, Curso Noturno – Rio Claro, 1959)


Minha sala de aulas no Instituto...
Paredes alvas sustentando o teto,
O quadro negro, qual sombrio luto,
E a porta aberta, num sinal de afeto.

Brancas cortinas sobre três janelas,
Velhas carteiras e u’a mesa ao lado,
Um grande quadro, de pinturas belas,
Com Monteiro Lobato retratado.

Um armário fechado, uma cadeira,
Professores ditando ensinamentos
E ali, feliz, a mocidade obreira...

Tudo tão belo e de visão ligeira
Que fui gravando, em olhos sonolentos,
Como um retrato para a vida inteira...

MOCIDADE E MORTE



(À memória do amigo Alberto Picarelli)


Por que será que a mocidade morre,
Quando é a luz da natureza viva,
Quando palpita na ilusão e aviva
A chuva de emoções que dela escorre?

Quando se troca uma paixão esquiva
Por lindo sonho que ao descrer socorre
E quando ao beijo do prazer se corre
Para afogar a solidão nociva?

É triste ver partir na flor da idade
Alguém que deixa as mágoas da saudade
Que não se pode amá-las, nem descrê-las.

Só nos consola saber que a mocidade,
Mesmo morta, não morre de verdade,
Como não morre o sol nem as estrelas!

NOIVOS


Estamos noivos, meu amor, estamos
Plantando as bases de um jardim divino
Que um dia serão frutos, serão ramos
Do lar sem manchas que te juro dar.

Agora tudo é sério, já passamos
Pelo namoro breve e repentino;
Agora, lentamente, nós levamos
O barco nosso para um vasto mar.

Ser noivo, meu primor, talvez já disse,
É colher um laurel na mocidade,
Ainda recordando a meninice;

E vamos caminhando nessa idade
A sorrir, sem temer a atroz velhice,
Que ainda é uma semente de saudade...

NUM ÁLBUM



Teu álbum é teu coração que assiste
O amor supremo de outros corações,
Pois muitos deles, neste mundo triste,
Guardaram ais, deixaram-te canções.

O coração é assim, o bem transmite
E não desperta nunca as más ações,
O homem sim, é que cruel insiste
Em sufocar as próprias ilusões.

Portanto, amiga, os breves versos feitos
P’ra te agradarem e que despontaram
Como expressões do bem entre os defeitos;

São deste coração que está comigo
Que te oferta as coroas que enfeitaram
A cruz de amor plantada em seu jazigo...